Samba Indígena Pataxó vira Patrimônio Imaterial de Porto Seguro

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Sambadeiros na Igreja Nossa Senhora da Conceição Foto: Theo Bueno

Prefeito Jânio Natal sanciona Lei Nº 1742/22, de autoria do Vereador Vinicius Parracho, que declara o Samba Indígena Patrimônio Cultural Imaterial de Porto Seguro.

O samba indígena de Raiz Pataxó possui cantos que são passados de geração para geração. Essas músicas narram histórias de suas tradições e a vida do cotidiano celebrando a ancestralidade, a natureza e a espiritualidade dos povos originários e tradicionais da Bahia.

Referências do século XVII trazidas pelo maestro Batista de Siqueira indicam os Tapuias como responsáveis pelo vocábulo Samba que para eles significava: lugar onde come-se, bebe-se e dança-se ” exatamente o que acontece no samba dos índios Pataxós. Os Tapuias e os Pataxós foram aliados diversas vezes como em 1815 para combater os índios Botocudos.

Que como toda essa região era um aldeamento era comum escravos se refugiarem com os indígenas e indígenas se refugiaram em quilombos. Por isso a troca cultural foi muito grande assim nasceu a umbanda e também o samba.

O patrimônio imaterial é transmitido de geração a geração, constantemente recriado pelas comunidades e grupos em função de seu ambiente, de sua interação com a natureza e de sua história, gerando um sentimento de identidade e continuidade, contribuindo para promover o respeito à diversidade cultural e à criatividade.

CONHEÇA A HISTÓRIA DO SAMBA INDÍGENA PATAXÓ DE PORTO SEGURO

Por Gisele Motta e Biraí Braz Borges Pataxó -Entre dezembro e fevereiro, todos os anos, acontecem os sambas religiosos na Aldeia Pataxó Barra Velha, no município de Porto Seguro, na Costao do Descobrimento.

São quatro festas tradicionais na aldeia: Nossa Senhora da Conceição, no dia 8 de dezembro; Santo Rei, no dia 6 de janeiro; São Sebastião, no dia 20 de janeiro; e São Braz, no dia 3 de fevereiro. Tradicionalmente, as comemorações começam no dia anterior de cada santo, e os foliões rompem o dia especial já em festa.

Em outras aldeias, outros santos são reverenciados, como é o caso de Santa Virgínia, na Aldeia Pé do Monte. Em Barra Velha, Nossa Senhora da Conceição é a primeira santa homenageada nos sambas, sendo ela padroeira da Aldeia Barra Velha, que dá nome à Igreja Católica do local.

A partir do final de novembro, já começam os festejos que contam com a presença dos sambadores e das sambadeiras do território, que fazem a folia pela casa dos moradores, principalmente nas dos chamados festeiros, que oferecem bebida e comida para todos.

O samba religioso da Aldeia Mãe dos Pataxó revela a raiz indígena do samba brasileiro, como retrata o documentário Sambadores e Sambadeiras da Aldeia Mãe – Raiz indígena do samba brasileira. Nas aldeias Pataxó, o samba é um ritual passado de geração em geração desde a época da invasão até os dias de hoje.

Imagem 1 – Sambadeiro em frente à Igreja Nossa Senhora da Conceição – Foto: Theo Bueno – Imagem 2: Samba Pataxó visto de dentro da Igreja N. S. da Conceição vazia – Fotos: Bruno Guimarães

Quem leva a festa hoje em dia é o grupo cultural Marujos Pataxó, formado por sambadores e sambadeiras da aldeia e, atualmente, consolidados na configuração de marujos e marujas. Os homens costumam bater os instrumentos, com privilégio para o pandeiro de acrílico, o tambor, o violão, o triângulo e o maracá.

As mulheres fazem a dança e a contradança em roda. A tradição indígena do samba é uma importante referência cultural da etnia pataxó, em sincretismo inevitável com a religião católica a partir da colonização.

FESTA DE NOSSA SENHORA DA CONCEIÇÃO

Todo dia oito de dezembro, uma missa e uma festa em frente à igreja marcam a homenagem a Nossa Senhora da Conceição e a passagem de um ramo indica quem será o festeiro do próximo ano. Todas as procissões têm as imagens dos santos da vez, e tanto a de São Sebastião quanto a de São Braz têm o elemento do mastro, que é retirado da mata e levado até a Igreja e de casa em casa.

A festa de Nossa Senhora da Conceição se diferencia por não ter o mastro e ser a mais religiosa, marcando o início oficial dos festejos. Essa festa tem mais missas e é quando a pequena igreja católica da vila fica mais frequentada. Os sambadeiros, após a missa da tarde, entram na igreja para cantar os sambas religiosos e denominam este momento de “louvar a noite”. A cantoria na Igreja dura pouco, cerca de três músicas, e logo os sambadeiros voltam a percorrer as casas levando a festa com eles.

No dia 20, às sete horas da manhã, os homens acordam e vão para a mata, retirar um grande mastro – Foto: Reprodução

A cada festa, as músicas fazem homenagem aos santos e ao momento, e resgatamos algumas aqui. Algumas das músicas tradicionais do Samba Pataxó foram tocadas na primeira live do grupo Marujos Pataxó, realizada com recursos da Lei Aldir Blanc, acessível no link a seguir: https://www.youtube.com/watch?v=fkKejiPL1vw.

As festas começam cerca de quinze dias antes do Dia de Nossa Senhora da Conceição de uma forma mais espontânea, com o esquema de bebida e comida na casa dos moradores. No dia 8, é a culminância, dia no qual acontecem as rezas e o samba na Igreja e a ida aos festeiros da vez.

Neste momento, já aconteceu a tradição do ramo: uma pessoa chamada de “chamador do ramo” fica em frente à Igreja, como num leilão, buscando os festeiros. Quem pega o ramo é responsável por dar a festa no ano seguinte. Muitas vezes, as pessoas fazem promessas para os santos, principalmente voltadas para boa saúde e recuperação, com isso, pegam logo o ramo e se comprometem com a festa. Após a missa, o samba, além de ir na casa dos festeiros velhos, vai na casa dos festeiros novos, para dar as boas-vindas.

Festa de São Braz em Barra Velha – Foto: Bruno Pinheiro

FESTA DE SANTOS REIS

A Festa de Santos Reis acontece no dia 6 de janeiro, sendo também conhecida como Folia de Reis, Companhia de Reis ou Reinado em outras regiões do Brasil. Ela celebra os três Reis Magos e sua reverência a Jesus como o Rei dos Reis. Os santos desse dia são São Baltazar, São Belchior e São Gaspar. Na Aldeia Barra Velha, essa festa não tem a tradição do mastro e seu diferencial são representações com crianças e adultos fantasiados de espíritos de animais e figuras tradicionais, chamadas de caretas.

Na Barra Velha, normalmente as crianças se fantasiam dos espíritos animais, principalmente os caticocos, também chamados de caxinguelês, um pequeno esquilo. São feitas fantasias dos caticocos e de outros bichos com a fibra do coqueiro e com papelões. São armações nas quais as crianças ficam dentro, controlando a fantasia.

A cada música, entra um animal na dança, como o tatu, a caipora, o urubu, com a intenção de chamar e reverenciar os espíritos da natureza. Os adultos normalmente se fantasiam de boi, também chamado de jaguará ou de vaca.

Samba religioso da Aldeia Mãe dos Pataxó revela a raiz indígena do samba brasileiro – Foto: Reprodução

O jaguará é feito com ossos da vaca, fantasia na qual há um pau, como se fosse um cavalinho de pau, onde o adulto monta. Aí, com os ossos, são montadas as bocas da vaca e do boi, com uma articulação de abre e fecha, sendo que o personagem realiza uma brincadeira de interagir com o público como se fosse morder as pessoas.

Nessa linha, temos também o “careta” do vaqueiro, que tem a competência de não deixar o boi ir para junto das pessoas, numa espécie de dança. A cada ano se discute quais animais sairão previamente. Outra “careta” tradicional é a figura da Maria Gostosa, que é um homem vestido de mulher. Há também a careta da Burrinha, uma fantasia como a de boi, só que menor e mais delicada.

FESTA DE SÃO SEBASTIÃO

A Festa de São Sebastião acontece do dia 19 para 20 de janeiro, e é quase tão animada quanto a de São Braz, a mais tradicional de todas. São Sebastião foi um soldado, e é considerado um guerreiro, um santo da Guerra. Seu sincretismo com as religiões de matriz africana traz a figura de Oxóssi.

No dia 20, às sete horas da manhã, os homens acordam e vão para a mata, retirar um grande mastro. O mastro que está em frente à Igreja é retirado e trocado pelo novo todos os anos. O pau é retirado da mata e acompanhado pela comunidade numa procissão, na qual vai se passando de casa em casa, deixando lascas da madeira para proteção.

O mastro é retirado da mata e as lascas são deixadas nas casas dos festeiros e dos moradores para proteção durante o ano – Fotos: Bruno Pinheiro)

As orações começam na Igreja no final da tarde, e, por volta das 20h, o samba sai da Igreja e percorre as ruas, as pessoas sambando e rezando. Dentro da igreja ou na casa do festeiro, as mulheres lideram o movimento de contradança, enquanto os homens tocam os instrumentos. As mulheres fazem o cozinhado em grandes tachos e as pessoas ficam no samba até o horário de comer. Depois que todos comem nas casas dos festeiros, as pessoas vão descansar e voltam para o samba da noite.

FESTA DE SÃO BRAZ

No dia 3 de fevereiro, tem a festa mais esperada e mais animada do território atualmente. É a festa de São Braz, considerado o senhor da cura e da doença – sincreticamente é associado com Omolu nas tradições afro-brasileiras. A diferença da puxada do mastro da mata para a Aldeia, nesta festa, é que ela é acompanhada por muitos foliões.

Na festa de São Braz, o mastro é levado pelos homens e acompanhado por toda comunidade, que derrama bebida alcóolica nos sambadeiros e no pau – Fotos: Bruno Pinheiro

Na festa de São Sebastião, praticamente estão presentes apenas os sambadores e homens necessários para puxar a tora de madeira. Já na festa de São Braz, toda a comunidade participa: jovens, mulheres, crianças, idosos. As mulheres se penduram e sobem em cima do mastro, as crianças pegam água e vão jogando nas pessoas. Homens e mulheres jogam bebidas alcoólicas uns nos outros e também no mastro.

Outra diferença é que, no caso do mastro de São Sebastião, ele é levado direto para a Igreja, enquanto o mastro de São Braz é levado de casa em casa antes de chegar na praça. Em cada casa que o mastro passa, os sambadores recebem a bebida dos festeiros.

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