Os 50 anos do Feminismo e o episódio da “Queima dos Soutiens” que nunca aconteceu

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Bra-Burning ou A Queima dos Sutiãs (1968) em Atlantic city, EUA – Foto: Reprodução do site da Uol

A “Queima” dos Sutiãs, no fictício episódio conhecido como Bra-Burning [Queima dos Soutiens], é evento que marca o Movimento Feminista nos Estados Unidos e no mundo, em setembro de 1968. No entanto, o evento mais incendiário desde a “instalação” do patriarcado sobre a face da terra teria sido, seguramente, a introdução – nas prateleiras das farmácias – da pílula anticoncepcional.

Com a pílula ocorre a dissociação entre procriação e prazer. Ao conquistar o orgasmo, a mulher rompe o antigo temor da maternidade indesejada e experimenta o direito de dar e receber prazer. O movimento feminista ganha status de revolução social.

Tudo havia começado no início dos anos 1950 nos Estados Unidos. A feminista Margaret Sanger e a milionária Katherine McCormick haviam se unido para inventar uma pílula contra a gravidez que fosse fácil de usar, eficiente e barata.

O cientista Gregory Pincus aceitou o desafio. Mas tinha que trabalhar às escondidas, pois os contraceptivos estavam oficialmente proibidos nos Estados Unidos até 1965. Ele alegou tratar-se de uma pesquisa para aliviar os sintomas da menstruação e encerrou seu trabalho cinco anos depois de iniciar as pesquisas. No dia 18 de agosto de 1960 lançou o novo produto no mercado norte-americano: o Enovid-10.

A pílula significaria uma verdadeira revolução nos hábitos sexuais do mundo ocidental.

De acordo com escritora e psicanalista Regina Navarro Lins, “as mulheres, há 5 mil anos, são humilhadas, desprezadas, escravizadas e constantemente utilizadas como forma de prazer para os homens”, sugerindo que, a partir desse marco, “dentre todos os papéis sociais, o que sofreu ataques especialmente intensos nos anos da contracultura foi o papel tradicionalmente atribuído às mulheres.”

COMO NASCEU O FEMINISMO

Antes de mais nada é preciso que se diga que o feminismo não nasceu em 1968, mas os acontecimentos daquele ano lhe dão um inegável impulso que vai perdurar por vários anos e décadas mais tarde, a reação esperada ao movimento feminista acontece a partir de 1980, quando a mídia passa a divulgar alarmantes sinais de que as mulheres haviam perdido muito com a revolta contra a histórica opressão masculina.

A onda reacionária ao feminismo forjou uma saga de heróis machos na literatura e no cinema norte-americano. É lá que a jornalista e feminista, Susan Faludi, publica, em 1991, o clássico “Backlash: o contra ataque na guerra não declarada contra as mulheres”.

Essa famosa obra analisa a onda conservadora que lutou para destruir as conquistas feministas que vieram a partir da década de 1960, “povoando os anos 80 de mitos que culpavam o feminismo pela suposta infelicidade das mulheres”.

Passeata de mulheres em Los Angeles em 1970 Foto: Arquivo da Uol

Claro que é preciso contextualizar o estudo de Faludi, abordando a realidade dos norte-americanos, no entanto essa situação pode ser reconhecida em qualquer lugar do mundo.

No Brasil, por exemplo, um país considerado conservador, e que ao mesmo tempo assiste a mudanças na estrutura familiar, notícias corriqueiras na imprensa, publicações em várias mídias, uma série de novelas, as produções cinematográficas, enfim, sucessivos conteúdos divulgados nos meios de comunicação de massa podem revelar que também enfrentamos pequenos golpes diários de reações antifeministas que tentam mandar as mulheres de volta aos tanques de roupas, aos fogões, às pias de pratos e aos cuidados com os filhos “de onde nunca deveriam ter saído e onde serão mais felizes”, no dizer de alguns.

Mesmo ao analisarmos aleatoriamente algumas publicações da época, percebemos a presença de um fio condutor de intencionalidade entre elas. Por exemplo, filmes emblemáticos como Atração Fatal (de Adrian Lyne) exibido na televisão brasileira em canal aberto e horário nobre de sábado, não são apresentados sem intencionalidade.

Observe que, mesmo em abordagens apenas superficiais como neste artigo é possível perceber que o processo de reação às conquistas do movimento feminista encontra fôlego em todos os recônditos onde houver “um macho ameaçado” no seu ambiente de trabalho e em tudo que ele acredita serem os seus domínios.

Bra-Burning ou A Queima dos Sutiãs (1968) em Atlantic city, EUA – Foto: Reprodução do site da Uol

Nesta vasta lista está incluído também o corpo, a sexualidade, o desejo, o querer, a vontade e quem sabe, a alma feminina.

“O homem encara qualquer pequena perda de status, de vantagem ou de oportunidade como terrível ameaça” escreveu Willian Goode em 1985, um dos muitos sociólogos a espantar-se “com a estranhamente hiperbólica reação dos homens diante de minúsculos progressos dos direitos da mulher”.

CONHEÇA A HISTÓRIA DA “QUEIMA DOS SOUTIENS”

O episódio conhecido como Bra-Burning,ou A Queima dos Sutiãs, foi um evento de protesto com cerca de 400 ativistas do WLM (Women’s Liberation Movement) contra a realização do concurso de Miss América em 7 de setembro de 1968, em Atlantic City, no Atlantic City Convention Hall, logo após a Convenção Nacional dos Democratas. Na verdade, a ‘queima’, propriamente dita, nunca aconteceu. Mas a atitude foi revolucionária. A escolha da americana mais bonitinha era tida como uma visão arbitrária da beleza e opressiva às mulheres, por causa de sua exploração comercial.

Elas colocaram no chão do espaço, sutiãs, sapatos de salto alto, cílios postiços, sprays de laquê, maquilagens, revistas, espartilhos, cintas e outros “intrumentos de tortura” (v. Duffet, Judith. WLM vs. Miss America. Voice of the Women’s Liberation Moviment. October 1968, pg 4.). Aí alguém sugeriu que tocassem fogo, mas não aconteceu porque não houve permissão do lugar (que não era público) para isso. Também ninguém tirou seu sutiã.

Essas lendas urbanas surgiram porque, ao dar ampla cobertura para o evento, a mídia o associou a outros movimentos – como o da liberação sexual e dos jovens que queimaram seus cartões de segurança social em oposição à Guerra do Vietnã – e passou a chamá-lo de “bra-burning”, (queima de sutiãs), encorajados por ativistas como Robim Morgan (ex-estrela-mirim da rádio e TV, ativista, escritora, poeta e editora do “Sisterhood is Powerful e Ms. Magazine). Na sequência, a manchete do New York Post saiu com o título “BraBurners and Miss America” (Queimadoras de Sutiãs e Miss América), que logo ficou associado às mulheres sem sutiãs. (Fonte: Blog dos anos 60).

 

 

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